Neste 7 de setembro, Dia da Independência do Brasil, escolhemos olhar para a ligação que existe entre o fortalecimento da democracia brasileira e o enfrentamento das nossas desigualdades. Diante da realidade do país, com a fome, o desemprego e a inflação assombrando a população pobre, é importante ressaltar que só a partir da valorização da democracia conseguiremos vislumbrar um futuro com mais justiça e menos desigualdades.
Também é necessário lembrar que o fortalecimento da democracia brasileira necessariamente passa pela maior representação de grupos vulnerabilizados, como mulheres, pessoas negras e pessoas LGBTQIA+ em instituições de poder e tomada de decisões. Com a maior representação destes grupos, a aprovação e implementação de políticas públicas capazes de transformar a vida de quem mais precisa torna-se mais factível.
“As instituições públicas tenderão a reforçar os mecanismos de desigualdade e a democracia irá se degenerando, até entrar em crise. Assim, não seria incorreto dizer que, sem um padrão mínimo de igualdade, a democracia sempre estará incompleta, pois não será capaz de refletir o interesse de todos os atores da sociedade de maneira equânime” Oscar Vilhena Vieira, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Direito SP
O paralelo entre regimes autoritários e o aprofundamento das desigualdades
A partir do trabalho de pesquisa realizado por Pedro Herculano Guimarães Ferreira de Souza, que analisou quase nove décadas de dados tributários e, a partir daí, empreendeu a análise mais completa que já foi feita sobre a variação da concentração de renda no topo da pirâmide social brasileira, observamos os picos de crescimento e de queda das desigualdades brasileiras.
Dos três principais momentos de aprofundamento das desigualdades brasileiras, dois aconteceram durante regimes autoritários: fim da República Velha e o Estado Novo, entre 1926 e 1945, e início da ditadura militar de 1964. O terceiro período de grande agravamento das desigualdades ocorreu durante a hiperinflação decorrente da crise econômica e política dos anos 1980.
“No primeiro período, que compreende o fim da República Velha e o Estado Novo varguista, o 1% mais rico saltou de 20% da renda nacional para 28%, com pico de 30% entre 1942 e 1943. A repressão e o autoritarismo da ditadura Vargas conviveu com a acomodação de interesses e pressões da parcela mais rica da população, fenômeno que passou ao largo da ampliação das bases sociais do Estado e se coaduna com a estabilidade da estratificação da sociedade à época.”
Trecho do relatório Democracia Inacabada
Durante ditadura civil-militar brasileira de 1964 a 1985, também houve um aumento da concentração de renda no topo.
“Nos primeiros anos da ditadura iniciada em 1964, o 1% mais rico passou de 17-19% da renda nacional, no início dos anos 1960, para 26%, em 1971, maior marca desde o pico do início dos anos 1940, fechando a década de 1970 na casa dos 25%”.
“A adoção de medidas privilegiando ganhos de capital sobre prejuízo do elemento trabalho — incluindo uma política salarial restritiva responsável pela redução de 30% no valor real do salário-mínimo entre 1964 e 197421, a repressão a sindicatos e outros movimentos reivindicatórios, e o favorecimento de ocupantes da alta hierarquia de grandes empresas22 — exemplifica as políticas sociais e econômicas adotadas pelo regime autoritário que contribuíram para o aumento da desigualdade no período.”
Ao observar estes fatos, é preciso ponderar que em um regime democrático, com as diferentes parcelas da população ocupando cargos em órgãos representativos, este tipo de medida dificilmente seria aprovada. Ao compararmos os períodos de agravamento das desigualdades com os períodos nos quais elas foram enfrentadas, o paralelo entre uma democracia forte e um Brasil menos desigual torna-se ainda mais inegável. O período de maior queda das desigualdades brasileiras pode ser usado como um exemplo eficaz. A partir da Constituição de 1988, foi possível a implementação e fortalecimento de política sociais, com ampliação de serviços públicos e ganhos reais de renda para os mais pobres, incluindo aumento do valor real do salário-mínimo.
“Milhões de pessoas anteriormente à margem de importantes políticas públicas passaram a se beneficiar da ampliação do acesso à saúde, educação e assistência social, com relevante impacto na redução da desigualdade. Esse processo se intensificou a partir do início dos anos 2000, com o fortalecimento dos investimentos sociais ao longo de diferentes governos. Resultado: uma década e meia de queda contínua dos indicadores de desigualdade.”.
O gráfico abaixo ilustra todo o raciocínio traçado até aqui.
É importante apontar que períodos de redemocratização só tornam-se períodos de enfrentamento de desigualdades quando as populações vulnerabilizadas de um país passam a ocupar lugares formais em órgãos representativos.
“Exemplos de países que se tornaram mais igualitários durante ditaduras ou mais desiguais sob a democracia indicam que o sistema político não explica, sozinho, as variações na concentração de renda, sendo necessário analisar as políticas públicas adotadas no período”
Já conferiu o relatório Democracia Inacabada ?
Todos os dados apresentados neste conteúdo foram retirados do relatório Democracia Inacabada, lançado recentemente pela Oxfam Brasil. Nele, além dos raciocínios apresentados aqui, outras análises e dados que provam a relação que existe entre mais democracia e menos desigualdades estão disponíveis.
Além disso, ao acessar o relatório, você também conhecerá quais são as nossas propostas para que possamos efetivamente caminhar para uma realidade mais justa e menos desigual.
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