“O setor privado tem uma grande responsabilidade na situação que a gente vive. É um dos grandes causadores dos problemas e, por isso, têm responsabilidade grande na solução deles”, afirmou Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil, durante sua apresentação nesta quarta-feira (22/6) no segundo dia de palestras do Encontro Nacional contra a Fome. “São interesses econômicos que alimentam a fome.”
Katia Maia participou do painel Sindemia: fome, obesidade e meio ambiente, juntamente com Janine Coutinho (Idec), Maria Emília (assessora da Fase e ex-presidente do Consea) e Joana Portugal Pereira (Coppe-UFRJ).
O segundo dia do encontro que está sendo realizado na sede da Ação da Cidadania, no Rio de Janeiro, foi dedicado ao tema Consequências da Fome e contou também com um painel sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e Segurança Alimentar.
Veja aqui como foi o primeiro dia do evento.
Katia Maia apresentou alguns dados que ilustram bem como a concentração de riqueza e poder está ampliando o fosso das desigualdades no Brasil e no mundo, com resultados trágicos para boa parte da população global.
“A desigualdade mata, e a fome é um dos seus instrumentos. Enquanto alguns poucos podem consumir os alimentos de melhor qualidade, a maioria mal consegue o que comer.”
Produção de alimentos de baixa qualidade e a fome
“Existe uma conivência da indústria alimentícia com a produção de alimentos de baixa qualidade e existência da fome no mundo”, afirmou Katia Maia durante sua apresentação. Maria Emília, da Fase, acrescentou em seguida que o problema de abastecimento alimentar não pode ser reduzido à questão de mercado ou economia. “O alimento, para quem precisa, não é uma mera ‘economia’. É preciso incluir alguns princípios, como diversidade, qualidade e questões culturais.”
Maria Emília apontou a contradição do papel do agronegócio brasileiro, que se vangloria de recordes de produção, mas negligencia seu papel na alimentação da população. “O que representa dizer que somos o ‘celeiro do mundo’, que o ‘agro é pop’? Cerca de 90% da produção do agronegócio hoje é de soja e milho, e boa parte é voltada para exportação.”
Maria Emília também fez incisiva defesa da reforma agrária, como fundamental para a democratização da terra no país. “A reforma agrária não é uma questão do passado, é uma questão do presente que nos prepara para o futuro.”
Joana Portugal Pereira, da engenharia ambiental da Coppe-UFRJ, apresentou dados sobre o impacto da agricultura no clima, na terra e no consumo de água no planeta. Segundo os dados apresentados pela especialista, os sistemas alimentares no mundo emitem hoje cerca de 15 bilhões de toneladas de gás do efeito estufa. Grande parte disso deve-se à produção de carne bovina.
“Se a gente conseguisse, hipoteticamente, de um dia para o outro, alterar nossas dietas e padrões de consumo, adotando dietas mais saudáveis, poderíamos reduzir nossas emissões em 8 bilhões de toneladas de gás do efeito estufa – 50% do total.”
Além de benefícios para o clima, essa alteração da dieta alimentar, com menos carne vermelha e mais verduras, legumes e peixe, teria uma série de benefícios à saúde humana, afirma Joana.
Fome tem solução, e nós sabemos disso
No painel dedicado `aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e Segurança Alimentar, que contou com representantes de diversos órgãos da ONU, os participantes reafirmaram sua confiança na possibilidade de se acabar com a fome no mundo. Recursos para isso a humanidade têm, mas é preciso haver vontade política.
“É possivel fazer da fome um capitulo do passado”, afirma Daniel Balaban, representante do Programa Mundial de Alimentos da ONU no Brasil. “A fome tem solução, nós sabemos como resolver. O que não é sustentável é continuar com o sistema de acumulação de riquezas que temos hoje.”
Para Rafael Zavala, representante da FAO no Brasil, nós sabemos o que fazer para enfrentar a fome: “ter uma agricultura com desmatamento zero para alimentar uma população com fome zero”.