May Solimar é publicitária, designer e ilustradora. Nasceu e vive na cidade de São Paulo. Produz artes com protagonismo negro. Venceu o prêmio de Arte Afrofuturista, promovido pela New African Renaissance em 2021. Já fez ilustrações para livros, antologias e até histórias em quadrinhos. Participou de duas Feiras de Artes Gráficas no Museu Afro.
Conheça um pouco mais sobre a artista convidada a ilustrar o nosso calendário 2024!
Conte um pouco sobre sua história
Sou formada em publicidade e propaganda, mas sempre fui apaixonada por arte. Quando pequena colecionava cadernos de desenhos cheios de rabiscos, histórias e sonhos. Naquela época nem imaginava que um dia minha arte poderia se tornar algo que tocaria as pessoas, a gente sempre ouve que “arte não dá futuro”, e por este mesmo motivo, jamais pensei em apostar nisso para minha construção profissional, deixando essa paixão como um hobby esporádico para acessar em momentos pontuais.
Foi em meio à pandemia que vi este hobby se transformar em oportunidade. Estávamos em caos, trancados em casa, com medo, isolados. Precisava de algo para me distrair, e sempre fiz desenhos como válvula de escape. Então adquiri uma mesa digital para variar um pouco do papel e lápis, e foi ai que surgiu a facilidade de publicação na internet do que fazia, afinal, a arte já fica ali no computador, prontinha para ser compartilhada.
Postei a primeira no meu Instagram que na época era pequeno, e recebi apoio. Me surpreendeu, ele era simples, mas as pessoas gostaram. Isso me fez querer postar mais e mais.
Como já estava dentro do ativismo a um tempo, fiz questão de colocar em minhas artes o protagonismo negro. Comecei a enxergar a arte para além dos meus desabafos pessoais, mas também como uma ferramenta que poderia instigar conversas a respeito de pautas importantes.
A partir daí sou uma eterna aprendiz na área das artes, não fiz aulas, então tudo que faço vem de experimentação. Tento uns traços novos, umas composições diferentes, colagens, gosto de fazer de tudo para construir minhas obras. Recentemente comecei a fazer quadrinhos, e percebi que também é uma linguagem que aproxima as pessoas. É de fácil entendimento, uma comunicação democrática.
Não sei dizer se tenho um estilo que a pessoa olhe e sabe que está vendo uma obra minha, e já me preocupei muito com isso. Mas hoje entendi que meu estilo é talvez não ter apenas um estilo, é esse transitar e deixar fluir o que tiver para aquele momento. Coloco muita emoção no que produzo.
Atualmente estou estudando design e tenho uma microempresa chamada Preta Comunica, onde tenho como foco a comunicação e designer antirracista.
Como você vê as desigualdades brasileiras?
O Brasil é um país que foi construído, estruturado, em cima da dor e da opressão. Todo o processo de existência dele tem manchas cruéis e por consequência, é repleto de problemas sociais.
Povos indígenas dizimados, africanos trazidos à força, como mercadorias, desumanizados, escravizados.
Meio ambiente completamente depredado.
Não tem como tentar refletir sobre as desigualdades do Brasil, sem olhar a história.
Tem um símbolo africano que se chama “Sankofa”, que explicando de uma forma simples, representa a importância de se olhar para o passado para se construir um futuro. Aprender com nossos erros, para prosseguir. Na minha opinião essa é a única via de melhora para a atual situação desse país.
Ali no passado houve uma sucessão de atos terríveis que culminaram em como estamos hoje, mas bastou, novas gerações vieram, e é preciso parar de cometer erros. É necessário corrigir o que passou, produzir oportunidade de melhoras. É preciso retratação, reavaliação, é preciso estancar aquela ferida que ainda sangra, e não seguir como se ela não existisse. Não dá para sair andando com os pés machucados, é preciso cuidar disso para depois seguir mais forte.
Fale sobre sua obra que está no calendário Oxfam Brasil 2024.
O convite para ter minhas obras no calendário Oxfam Brasil 2024 me deixou muito feliz. Eu não esperava e fiquei chocada. Realmente não é fácil viver de arte (rsrs), não tem muitas oportunidades e tem muitaaa gente talentosa por aí.
Minha arte é ativista, o que torna as coisas um pouquinho mais difíceis, pois não é algo que se encaixe com qualquer produto, empresa ou instituição. A Oxfam é uma ong que conheço e admiro a uns anos, faz trabalhos voltados justamente ao estancamento dessa ferida que é a desigualdade social como havia citado anteriormente. Estou muito grata e contente por ter minhas obras associadas a uma organização assim.