A Relatora Especial sobre a situação de pessoas defensoras de direitos humanos da ONU, Mary Lawlor, está no Brasil e se mostrou muito preocupada com as ameaças de violência para quem defende o direito à terra no país. Nesta sexta-feira (19 de abril) Lawlor publicou uma declaração onde chama a atenção para o fato de que “Pessoas defensoras de direitos humanos estão sob extrema ameaça” e que mesmo que o governo federal tenha consciência disso “até agora não conseguiu implementar as estruturas necessárias para proteger defensoras e defensores”.
A Oxfam Brasil atua na defesa do direito à terra de povos indígenas, povos e comunidades tradicionais, agricultores familiares e camponeses. Em 2022, em conjunto com a Comissão Pastora da Terra Nordeste II, apoiamos mais de 1000 famílias ameaças por tentativas de grilagem e expulsão. Temos alertado para a violência contra defensores de direitos no país há vários anos. Em nosso relatório Defensores em Perigo, colocamos nossa extrema preocupação com o recrudescimento da violência em vários países da América Latina, incluindo o Brasil. Nossa região é a que mais mata defensores de direitos.
Mary Lawlor coloca como motores da violência contra defensores a impunidade sistêmica e os interesses econômicos. Esse ano, lançamos o relatório Desigualdade S.A. onde mostramos como a captura política feita pelas grandes empresas enfraquece a democracia e incentiva a impunidade, colocando o bem comum a reboque de interesses privados. A violência no campo no Brasil é uma combinação do legado de injustiças antigas, como o racismo, o machismo e a escravidão, com o momento de desigualdade extrema da fase atual do neoliberalismo que leva a superexploração das pessoas e da natureza.
A situação é agravada pela tendência à criminalização dos defensores e defensoras de direitos, em especial as mulheres negras e não brancas. Essa tendência é acompanhada de um fenômeno ainda mais preocupante: a cumplicidade e participação direta de alguns atores e entidades estatais em ações de violência contra defensores e defensoras. As recentes notícias sobre os mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco mostram isso.
Frente a esta situação, somamos nossa voz a de ativistas, defensores, movimentos e entidades de defesa de direitos para cobrar que o governo federal adote medidas no marco da Declaração de Defensores de Direitos Humanos da ONU, como:
- Elaborar políticas de proteção para o trabalho e integridade das pessoas defensoras de direitos humanos, suas famílias e entornos, com participação ampla da sociedade civil e sob a liderança das instâncias responsáveis, assegurando que elas contem com recursos e orçamento para sua implementação.
- Investigar, julgar e condenar de forma efetiva e oportuna qualquer tipo de agressão (ameaças, perseguições, assassinatos) contra os direitos humanos.
- Eliminar qualquer forma de repressão, assédio e criminalização que possa ser infringida por instituições públicas ao trabalho das pessoas defensoras de direitos humanos.
- Elaborar e implementar medidas específicas para a proteção das mulheres defensoras.
- Garantir que os mecanismos de proteção governamental existentes adotem medidas de prevenção que evitem ataques contra defensoras e defensores e gerem condições para que possam realizar seu trabalho sem temer represálias e com pleno reconhecimento social.
- Recolher dados desagregados sobre crimes cometidos contra pessoas defensoras, assim como sobre as medidas tomadas a respeito, e publicá-las regularmente como forma de fomentar a transparência, melhorar o acesso à informação, diagnosticar e prevenir problemas, além de prestar contas.
- Garantir uma análise adequada de gênero nos mecanismos de proteção governamentais para a proteção de mulheres defensoras.
- Fortalecer o acesso seguro de defensores/as aos mecanismos internacionais de proteção dos direitos humanos, como a Declaração dos Defensores dos Direitos Humanos e a Resolução da Assembleia Geral da ONU sobre a proteção das defensoras dos direitos humanos.
- Apoiar a aprovação do PL 572-22 que cria um marco sobre direitos humanos e empresas no Brasil, responsabilizando as empesas pelas violações de direitos que estejam envolvidas.
- Vetar as mudanças propostas na Lei Geral do Licenciamento Ambiental, PL 2159/2021, que enfraquecem a institucionalidade de proteção de direitos e consulta às partes atingidas por empreendimentos.
- Acelerar o processo de demarcação e de homologação de terras indígenas se quilombolas de forma a cumprir com o artigo 67 das Disposições Constitucionais Transitórias.
- Responder, de forma urgente e efetiva, à demanda pelo acesso e controle da terra e dos meios de produção por parte das populações rurais, com a tomada de medidas concretas que contribuam para a redistribuição da propriedade da terra e maior equidade, colocando em prática as Diretrizes sobre a Governança Responsável da Propriedade da Terra, dos Recursos Pesqueiros e Florestais no Contexto da Segurança Alimentar Nacional da FAO/ONU.