Um dos grandes desafios em tempos de coronavírus diz respeito à educação no Brasil. Como o coronavírus afeta a educação? Em todos os países, estudantes tiveram as aulas paralisadas devido à necessidade de distanciamento social. Assim, as desigualdades do acesso ao ensino à distância ficam bem expostas.
No Brasil, esse hiato no ano letivo aumenta as já enormes desigualdades entre os alunos nas redes pública e privada. A crise é agravada pela sinalização de fim do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), que custeia a educação básica no país.
Cerca de 60% dos gastos na educação pública brasileira vêm do Fundeb, que entrou em vigor em 2007 – mas que, por lei, irá deixar de vigorar em 31 de dezembro de 2020. Assim, se o fundo não for renovado até o final do ano pelo governo e Congresso, há o risco de um caos na educação com comprometimento nos pagamentos de salários de professores, manutenção de salas de aula, novas escolas, entre outros gastos necessários.
Para entender como o coronavírus afeta a educação e quais as soluções possíveis, precisamos ter estratégias emergenciais, mas também de longo prazo. Este é um problema estrutural da educação pública no Brasil que já existia antes do coronavírus.
A educação no Brasil pré-coronavírus
Como aponta relatório recente da Unesco, o fechamento de escolas devido às medidas de isolamento social tomadas para evitar a propagação do coronavírus atingiu 91% dos estudantes em todo o mundo. No Brasil, foram 52,8 milhões de alunos afetados, da educação infantil ao ensino superior.
O Anuário Brasileiro da Educação Básica, produzido pela ONG Todos Pela Educação, mostra que em 2018 existiam 39.460.618 alunos de educação básica matriculados na rede pública de ensino, contra 8.995.249 na rede privada.
Entretanto, o direito à educação de qualidade ainda está longe de ser assegurado para todos. Ainda segundo o Anuário, menos da metade dos alunos da rede pública atingiram níveis de proficiência considerados adequados ao fim do 3º ano do Ensino Fundamental em Leitura e Matemática. Em Escrita, os níveis de proficiência também estão distantes do razoável: 33,8% dos alunos encontram-se em níveis insuficientes.
Questões regionais no acesos à educação
Um levantamento feito pela Fundação Abrinq mostra que a infraestrutura das escolas é uma grande desafio para os estudantes no Brasil, principalmente os das regiões Norte e Nordeste. Nestas regiões, por exemplo, existem grandes déficits em coleta de esgoto, abastecimento de água e acesso à energia elétrica – especialmente na Região Norte.
O Anuário Brasileiro da Educação Básica mostra ainda que, das 48,6 milhões de matrículas feitas na educação básica do país em 2018, 5,5 milhões de alunos viviam em zonas rurais, 256,9 mil eram indígenas e 258,6 mil quilombolas.
EAD no contexto do coronavírus
O EAD (ensino à distância) é a solução mais óbvia quando se pensa na questão de como o coronavírus afeta a educação. Mas como viabilizar o acesso à internet para alunos em regiões isoladas? Como pensar em uma estrutura para o ensino à distância em regiões onde falta o básico?
O Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) revelou em uma pesquisa divulgada em 2019 que 58% dos domicílios no Brasil não têm acesso a computadores e 33% não dispõem de internet. Os dados apontam ainda que, nas áreas rurais, 43% das escolas não têm acesso à internet. Além disso, a desigualdade no acesso à rede é ainda maior nas classes mais baixas.
O EAD já era permitido para o ensino superior no Brasil – mas, no caso do ensino fundamental, só é permitido em situações emergenciais, como a que vivemos com a pandemia de coronavírus.
Além da questão do acesso dos alunos à internet, outro ponto que vem sendo discutido com relação à implementação do EAD como solução para as aulas em tempos de coronavírus é a necessidade de preparação dos professores para que lidem com esse novo formato de aulas. Não basta o acesso, é preciso uma nova metodologia para aulas.
É preciso também esclarecer que o EAD pressupõe toda uma metodologia e formato de acesso com interação. Entretanto, emergencialmente, existe o formato que vem sendo adotado em muitas escolas no Brasil, onde as tarefas e atividades podem ser enviadas aos alunos por e-mail ou mesmo Whatsapp e conferidas pelo professor posteriormente.
Soluções para a educação no contexto de coronavírus
Historicamente, a educação sempre se mostrou como um elemento importante na recuperação de países após crises como guerras e pandemias. Sendo assim, no atual contexto de coronavírus não seria diferente. Os alunos são uma importante via de conexão entre a sociedade e o poder público.
Nesse sentido, além de se pensar em como lidar com a situação agora, garantindo formação dos professores para esse novo formato de aulas aliado ao acesso dos alunos à internet, é necessário também se pensar no contexto pós-coronavírus, quando os alunos retornaram às aulas em contextos muito diferentes de aprendizagem.
Por isso, o investimento público em educação é fundamental. Como apontamos em nosso relatório País Estagnado: um retrato das desigualdades brasileiras, os gastos sociais são obrigação do Estado e necessários no enfrentamento das desigualdades e da pobreza. O tamanho das desigualdades no Brasil e o elevado número de pessoas em situação de pobreza demandam continuidade, visão de largo prazo, progressividade e qualidade.
Dessa forma, a revogação da Emenda Constitucional 95/2016 (Teto de Gastos) é fundamental e urgente para garantir investimentos em educação agora e no cenário pós-coronavírus.