Foto: Marcello Casal Jr. /Agência Brasil
Em meio à maior crise sanitária dos últimos tempos, as eleições municipais 2020 foram realizadas, e o resultado foi um aumento da representatividade política de mulheres, negros, quilombolas, indígenas e LGBTQIA+ no país.
Novas candidaturas foram lançadas em todo o país como resistência e representação de grupos em situação de vulnerabilidade da sociedade brasileira. As eleições 2020 foram marcadas pelo aumento significativo de diversidade nas cidades brasileiras.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) registrou pela primeira vez uma maioria de candidatos negros no país, com total de 48,9% — contra 47,8% de brancos. Apesar de a maioria dos candidatos negros terem concorrido para cargos de vereador, e não de prefeitos, estamos presenciando um efeito positivo dos movimentos negros no aumento da representatividade eleitoral.
Outro dado apresentado pelo TSE mostra que 10 mil candidatos mudaram suas declarações de raça e passaram a se autodeclarar ‘negro’ e ‘pardo’.
Houve também aumento do número de candidaturas LGBTQIA+, totalizando 411 candidaturas contra as 215 registradas nas eleições anteriores, em 2016. De indígenas ocorreu um aumento de 27%, chegando ao número de 2.177 contra 1.715 em 2016.
Alguns pesquisadores acreditam que esses avanços poderiam ser ainda maiores, mas com a pandemia do novo coronavírus, muitos líderes comunitários estão se dedicando exclusivamente à luta contra a doença nas periferias e comunidades tradicionais.
O histórico das eleições no Brasil
Em 2017, pesquisa do Instituto Ipsos mostrou que 94% dos entrevistados revelaram não se sentirem representados pelos políticos em que votaram. Em 2018, o TSE apontou que havia uma predominância de candidaturas de homens brancos no Brasil. Além disso, foram 68,4% candidatos homens, contra 31,6% de mulheres.
Na pesquisa sobre raça, os brancos foram 52,4% das candidaturas, enquanto outras etnias somadas ocuparam 47,6%. Quando falamos de candidatos eleitos, a discrepância aumenta: 84,9% são homens e 75% do total são declarados brancos.
O alarmante número mostrou um descolamento entre a constituição da população brasileira e os políticos eleitos. Isso acontece porque o direito de votar e ser votado foi construído no Brasil com a exclusão de indígenas, negros, mulheres e pobres — cenário visível até hoje.
Grupos historicamente vulneráveis encontram dificuldades em escolher candidaturas que os represente e de terem candidatos próprios eleitos, quando decidem entrar nas disputas eleitorais.
Os candidatos encontram barreiras dentro dos próprios partidos políticos, com as verbas sendo distribuídas principalmente para candidatos brancos e homens, perpetuando o cenário de pouca representatividade.
As dificuldades nas eleições municipais 2020
A pandemia do novo coronavírus trouxe grandes impactos, ainda invisíveis, para a eleição municipal de 2020. Cerca de 23% do eleitorado brasileiro não compareceu às urnas — isso representa cerca de 25 milhões de pessoas que deixaram de votar no primeiro turno e 7 milhões no segundo turno. O número de óbitos e de pessoas infectadas, que não podiam sair de casa, também influenciaram na votação.
Em Macapá (Amapá), o apagão de energia que durou mais de 12 dias provocou o cancelamento da votação na data prevista. Os apagões e racionamento de energia dificultaram os candidatos na campanha eleitoral e o acesso dos eleitores às propostas. O TSE decidiu por transferir a data de eleição para o dia 13 de dezembro.
Muitos candidatos pelo Brasil também preferiram manter a segurança de seus eleitores, diminuindo a entrega de panfletos e realização de comícios. Além disso, com a proibição de manifestações, houve grande dificuldade para engajar eleitores, tendo impacto direto no resultado final.
A democracia representativa em 2020
As eleições municipais 2020 trouxeram uma mudança de paradigma para as câmaras de vereadores e prefeituras pelo país, com mais candidatos progressistas eleitos.
As mulheres passam a compor 12,2% das prefeituras e 18% dos vereadores do país. Em Belo Horizonte, a candidata com maior votação foi Duda Salabert, mulher transgênero. Em São Paulo, Erika Hilton e Tammy Miranda, ambas transgêneros, foram as campeãs de votos.
No total, foram eleitos quase 26 mil vereadores negros em todo o país, o que dá 6% do total de vereadores eleitos. Isso representa um aumento de 200% em relação a 2016.
O número de mulheres negras eleitas também aumentou este ano. Em Porto Alegre foram 4 mulheres eleitas por diferentes partidos, Vitória teve 10 mulheres negras entre as mais votadas e, em Curitiba, a professora Carol Dartora foi a primeira vereadora negra eleita da história da cidade.
Também houve aumento do número de quilombolas eleitos, totalizando 56 para cargo de vereadores em todo o Brasil, e 145 indígenas foram eleitos para a câmara dos vereadores, 8 para prefeituras e 6 para cargos de vice-prefeito.
Um dos primeiros passos para a consolidação da democracia é a representatividade política dos grupos em situação de maior vulnerabilidade na sociedade, como os negros, as mulheres, os quilombolas, a população LGBTQIA+ e os indígenas.
As urnas das eleições municipais 2020 mostraram que a diversidade política é o caminho para a democracia representativa. A população está caminhando para votar naqueles que os representam e que entendem as demandas da periferia e dos mais vulneráveis.
Quer saber mais sobre a luta das mulheres negras na política e como elas estão mudando o Brasil? Acesse nosso artigo sobre a importância da representatividade desse grupo e complemente sua leitura.