O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo e nossa desigualdade tem muitos contornos. Ela se expressa de maneira chocante nas desigualdades de renda e de patrimônio (riqueza), em que – considerando dados tributários – o 1% mais rico ganha 72 vezes mais que os 50% mais pobres e 6 bilionários possuem a mesma riqueza que 100 milhões de pessoas. Temos também desigualdades brutais de raça e gênero. Mulheres ganham 70% do que os homens ganham e pessoas negras ganham 57% do que as brancas ganham. Mas ela também se evidencia também na desigualdade na posse de terra.
A concentração de terras no Brasil perpassa todas as demais desigualdades, contribuindo e reforçando um país repleto de injustiças. Esta é uma desigualdade histórica que custa a ser superada. De acordo com o artigo acadêmico recém publicado pelo Imaflora e intitulado “Quem são os poucos donos das terras agrícolas no Brasil”, em todos os estados do Brasil 10% dos imóveis (os maiores) concentram mais que 50% da terra.O estudo teve como base o Atlas Agropecuário do Imaflora, que cruza diversas bases de dados sobre terras, em especial o CAR e o SIGEF, e busca estabelecer um mapa da malha fundiária do país.
Concentração de terras piorou
O resultado esta alinhado com os dados do último Censo Agropecuário do IBGE, que já apontou uma piora na concentração de terras: em 2017, 0,95% dos estabelecimentos (aqueles com mais de 1000 hectares) concentram 47,5% da terra – uma área equivalente a França, Espanha, Portugal, Bélgica, Holanda e Alemanha juntas. Porém a análise do Imaflora traz mais nuances e detalhes que evidenciam o quão grave é a situação.
De acordo com o novo estudo publicado, 25% de toda a terra agrícola do Brasil é ocupada por 0,3% dos imóveis (cerca de 15 mil) – que estão localizados principalmente nos estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e na região do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). Áreas conhecidas pela presença da soja, milho, cana e gado. Ainda segundo o Imaflora, o grupo dos 10% maiores imóveis ocupam 73% da área agrícola do Brasil.
O estudo ainda apontou a importância da reforma agrária, já que quando se considera os assentamentos de reforma agrária o índice de Gini fica menor. Porém, os pesquisadores ressaltam que o fato de a reforma agrária ser feita principalmente com áreas públicas faz com que seja muito diminuído o seu impacto sobre a desigualdade.
A publicação deste estudo na última semana foi muito importante. O país discute a MP 910, que por hora teve a votação adiada, mas que sob a justificativa de regularização fundiária mantém a possibilidade de retrocesso com a apropriação de vastas extensões de terras públicas por grandes e médios proprietários.