Auá Mendes, Indígena do Povo Mura, artista visual que transita entre Manaus e São Paulo, tem sido um farol de reflexão e transformação através de seu trabalho. Com uma carreira que abrange desde o grafite até a arte-educação, Auá transforma sua vivência e a riqueza cultural do Amazonas em expressões que questionam a relação entre corpo e território.
Influenciada pelo legado ancestral e pela realidade contemporânea, Auá encontra inspiração nas palavras de Ailton Krenak e na urgência dos desafios socioambientais enfrentados pelas comunidades indígenas. Sua obra reflete a luta contra a violência à natureza e às comunidades marginalizadas, em um grito visual que clama por mudança.
Neste contexto, sua participação no calendário Oxfam Brasil 2025 marca um ponto culminante em sua trajetória. O projeto a desafiou a abordar temas profundos e variados—desde desigualdades climáticas e territoriais até questões de gênero—por meio da arte.
A proposta exigiu de Auá, que recentemente teve as obras do calendário exibidas na exposição “Justiça Climática: uma Discussão do Presente”, que celebrou os dez anos da Oxfam Brasil, não apenas a expressão criativa, mas também a capacidade de engajar o público em diálogos significativos sobre justiça e equidade.
Confira a entrevista completa:
Você pode contar um pouco sobre sua história?
Sou Auá Mendes, Indígena do Povo Mura, nasci em Manaus, Amazonas e atualmente moro em São Paulo.
Sou artista visual, designer gráfica, ilustradora, muralista, grafiteira, arte-educadora e já desenvolvi uma série de projetos com empresas como: Sesc, Natura, Google Banco do Brasil, entre outros, que gerou trabalhos pelo Brasil e mundo a fora.
Meu trabalho sempre está nesse lugar do questionamento sobre o meu corpo nesses lugares, então acabo fazendo sempre essa reflexão do corpo-território e muito dos meus trabalhos refletem essa realidade.
Quais são as suas influências como artista?
O que me inspira a fazer o que eu faço vem do povo e do território que eu pertenço, do ontem e do hoje, como diria Ailton Krenak no seu livro Futuro Ancestral, não há possibilidade de pensar no futuro sem pensar no que veio antes, então o meu trabalho faz essa reflexão que mistura o hoje ao que veio ontem.
Bebo muito das referências dos anciões, meus pais, meus avós, minhas irmãs, assim como outros artistas, como meu companheiro e meus amigos, que também criam arte e acabam me influenciando.
Como você vê as desigualdades brasileiras?
É graça ao movimento indígena que hoje, nós, indígenas, podemos viver nossas individualidades. Não podemos descartar que ainda existem muitas formas de violência ao nosso redor e a violência à natureza é a que mais nos prejudica, ela violenta o nosso bem-viver e a nossa saúde.
Esses dias estamos vendo nuvens de fumaça que é fruto das queimadas e vem cobrindo todo o Brasil, um aprendizado que as comunidades indígenas nos dão nesse contexto é que a natureza não é e não pode ser uma ferramenta de poder. Já é tempo da humanidade aprender que precisamos coexistir com a natureza e não a usar e destruí-la.
Eu gosto muito de uma concepção popular que nos alerta que se o mundo acabar a natureza pode até sentir, mas ela é cíclica, quem irá terminar deixando de existir somos nós.
O mundo passa por grandes mudanças, mas a ganância do capital ainda acaba influenciando muitas coisas e são justamente essas que acabam não se horizontalizando.
Fale sobre sua obra que está no calendário Oxfam Brasil 2025
Os temas que a Oxfam Brasil me propôs eram bastante sérios e conciliou com o que eu falo e venho me movimentando para expor.
Como que esses assuntos vão ser possíveis de serem discutidos a partir da imagem, então foi um momento de refletir sobre várias formas de desigualdade: climática, territorial, de gênero e entre tantas outras.
De certa forma todos os assuntos que foram falados são lugares no qual eu já estive, me questionando, lendo ou pesquisando, porque antes de direcionar meu trabalho apenas para a parte artística eu fiz parte de alguns movimentos estudantis da minha cidade, então sempre estamos ligados aos assuntos que envolvem os territórios e a justiça climática.
A grande questão para mim era pensar como eu trato isso de uma forma que as pessoas olhem e sintam-se convidadas a se aprofundar. Como trazer esses diálogos mais profundos através da arte principalmente para quem nunca ouviu falar ou refletiu sobre isso.
Conheça as obras que estão no calendário 2025 da Oxfam Brasil: