As forças israelenses impuseram um domínio quase total sobre a Cidade de Gaza e a região norte, cortando o território ao meio, desde o muro da fronteira até ao mar. Um membro da equipe da Oxfam compartilhou ontem um relato angustiante de sua família:
“Escapamos da morte duas vezes hoje. (Nós nos sentimos) como ratos em uma gaiola. A Cidade de Gaza está fechada e ouvimos dizer que pessoas que viajavam em busca de abrigo no Sul foram alvo de um ataque aéreo e morreram. Parece que eles vão bombardear a área. Shifa (o hospital internacional) é um inferno de pesadelo, com esgoto transbordando. As moscas são como fisiculturistas, enormes, são tão grandes e enxameiam por toda parte, imunes às nossas tentativas de matá-las. A “zanana” (o som dos drones militares) é alta e nunca sai do céu.”
Alhasan Swairjo, que trabalha no serviço humanitário da Oxfam, conseguiu contactar ontem colegas de onde está abrigado com a sua família no norte de Gaza, gravou um áudio em que dizia:
“Estamos compartilhando recursos com outras dez famílias. Os mercados quase vazios. Não há comida fresca em toda a cidade. Dependemos de comida enlatada. Os mercados de pão não têm eletricidade e apenas uma quantidade limitada de combustível – um dia, dois dias, cinco dias – não sabemos. Estamos fazendo pão em casa, mas não sabemos se teremos gás de cozinha suficiente nos próximos dias. Nossos filhos estão sofrendo, eles não entendem por que nos mudamos, por que Israel está atirando em nós. Não podemos dar uma boa explicação por que tudo isso está acontecendo. Agora estamos lutando para sobreviver, nossos filhos estão lutando para sobreviver.”
A decisão de Israel de privar os civis em Gaza de bens essenciais à sua sobrevivência, tais como alimentos, água, combustível, medicamentos e outra ajuda, equivale a uma punição coletiva e a uma violação do direito humanitário internacional. A ordem de evacuação de 13 de outubro não diminui o estatuto de proteção dos civis que não podem ou não querem partir e é possivelmente inconsistente com as obrigações legais de Israel, dados os perigos adicionais que criou.
As comunicações são tão irregulares que não deixam meios para uma responsabilização adequada e independente. Os civis nunca devem ser alvo de ataques e, se decidirem permanecer nas suas casas, têm o direito de fazê-lo em segurança. A Oxfam acredita que existe riscos ainda mais atrozes para a vida dos civis no norte de Gaza.
A Oxfam está financiando e mantendo contatos intermitentes com uma série de organizações parceiras que ainda operam no sul de Gaza, obtendo alguma ajuda de origem local para as famílias. Contudo, o apoio humanitário é virtualmente impossível no Norte.
Os mais de dois milhões de pessoas agora espremidas na parte sul de Gaza também enfrentam uma situação insegura, caótica e incerta, com água, alimentos, medicamentos e combustível insuficientes.
O único ponto de passagem de Rafah (cidade mais ao sul de Gaza) para o Egipto está aberto a uma pequena quantidade de ajuda, ontem aumentada para 102 camiões depois de muitas disputas diplomáticas, mas que está longe de ser suficiente para satisfazer as enormes e crescentes necessidades das pessoas. A oferta de farinha de trigo em Gaza está tão baixa que poderá esgotar-se dentro de uma semana.
A Oxfam condenou o Hamas pelo seu ataque de 7 de outubro e pela morte de 1.400 israelenses, na sua maioria civis, e pela tomada de mais de 200 reféns – violando o direito humanitário internacional; todos os reféns detidos pelo Hamas e por grupos armados devem ser libertados imediatamente e sem condições.
A Oxfam condena Israel pela evacuação do norte de Gaza – o que equivale a uma transferência forçada – pelos seus ataques aéreos militares e pela guerra terrestre que custaram as vidas de mais de 9.000 palestinos e feriram incontáveis outros, 6.086 dos quais mulheres e crianças, até 2 de novembro. A crise militar entre Israel e o Hamas e o subsequente cerco causaram uma catástrofe humanitária em Gaza. Israel está utilizando a fome como arma de guerra, um crime ao abrigo do direito humanitário internacional, e que não está sendo mitigado pela retomada de uma pequena quantidade de ajuda através de Rafah.
A Oxfam apela a um cessar-fogo imediato, à concessão de acesso e ajuda humanitária, e à comunidade internacional para pressionar pelo fim da ocupação prolongada do território palestiniano por Israel, incluindo o levantamento do bloqueio a Gaza.