A Oxfam Brasil participou, entre os dias 19 e 21 de março, do I Encontro Estadual do Conselho Nacional de Populações Extrativistas (CNS) no Pará, que contou com a participação de 120 extrativistas de diversas regiões do estado. Durante o evento, realizado em Belém, foram discutidos os principais desafios das comunidades extrativistas do Pará e apresentado o curta documentário Tem Floresta em Pé, Tem Mulher, da campanha apoiada pela Oxfam Brasil. O filme foi exibido no segundo dia do encontro, na mesa “O Protagonismo das mulheres extrativistas: projeto das Nices e Dijés”, que contou com a participação de Maria Nice Machado (Dona Nice), secretária nacional de Mulheres Extrativistas do CNS; Letícia Moraes, vice-presidenta do CNS; Edel Moraes, secretária nacional de Povos e Comunidades Tradicionais do Ministério do Meio Ambiente; e Selma Gomes, coordenadora de Justiça Climática e Amazônia da OXfam Brasil.
“O filme é muito importante para o protagonismo das mulheres extrativistas. O projeto visa dar visibilidade ao papel das mulheres na proteção das florestas”, afirmou Laídes Moraes, representante do CNS.
Em sua apresentação, Selma Gomes contou um pouco da história da Oxfam Internacional, que apoiou a luta de Chico Mendes e do movimento seringueiro, e detalhou o projeto Das Nices e Dijés e a campanha Tem Floresta em Pé, Tem Mulher.
Selma destacou ainda a importância da parceria da Oxfam Brasil com o CNS, a Conaq e o MIQCB na construção do projeto e da campanha, rendendo homenagem à Dona Dijé, com toda a sua luta e ancestralidade, e celebrando quem continua na luta hoje, como Dona Nice, presente ao evento.
Identidade extrativista
Durante o encontro, enfatizou-se a identidade das comunidades extrativistas, que inclui diversos segmentos sociais – ribeirinhos, pescadores artesanais, marisqueiros, seringueiros e castanheiros, entre outros. Essa identidade vem sendo criada e construída desde a fundação do CNS, em 1985, com Chico Mendes.
“Queremos provocar que outras histórias como essas sejam contadas. Pensem que as Nices e Dijés são vocês, cada uma de vocês tem uma história para contar, vocês são importantes”, afirmou Edel Moraes.
Um dos temas centrais do encontro foi a importância das comunidades extrativistas para a preservação e desenvolvimento sustentável das reservas locais, e do entendimento do papel do ICMBio como fiscalizador das unidades de conservação.
Justiça social e ambiental
Os participantes do encontro deixaram evidente a necessidade de se ter justiça social como condição fundamental para se ter justiça ambiental. Uma não existe sem a outra. Além disso, é urgente o desenvolvimento de políticas públicas de educação para os territórios, para a formação de jovens para que permaneçam em suas comunidades.
Também foi discutida a necessidade de se ter formações em diversos temas, principalmente os ligados a políticas climáticas, como mercado de carbono, REED e Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Há uma preocupação com a ‘grilagem verde’, como a venda de carbono no mercado internacional em que empresas chegam nos territórios com promessas falsas.
Foi apresentado durante o evento o Fundo Puxirum, criado recentemente pelo CNS para apoiar as comunidades extrativistas na Amazônia brasileira.
Diversas lideranças enfatizaram que o CNS tem capacidade para gerir projetos com grandes volumes de recursos financeiros, mas que ainda existe um certo ‘preconceito institucional’ em relação às organizações dos movimentos sociais, que só recebem pequenos projetos.
Regularização fundiária
Bruno Kono, presidente do Instituto de Terras do Pará (Iterpa), afirmou que a regularização fundiária coletiva é prioridade hoje do Estado e informou que o instituto está fazendo parceria com o ICMBio para a criação de reservas extrativistas no Pará, a partir do mapeamento de áreas que são do estado e da União. Também estão discutindo parcerias com o Incra e Secretaria de Patrimônio da União (SPU) para avançar nos processos de regularização fundiária.
Diversos relatos de representantes de comunidades locais revelam que há mais de uma década esperam avanços nos processos de criação de reservas extrativistas, de desenvolvimento sustentável e extrativas marinhas, além de projetos de assentamentos agroextrativistas, quilombos e processos de concessão de direito real de uso em áreas da Marinha.
A não regularização fundiária gera diversos conflitos com madeireiros e grandes empresários de diversos setores, como o setor imobiliário. Alguns exemplos:
- Reserva Extrativista Tapajós Arapiuns, em Santarém-PA: diversos conflitos com madeireiros.
- Reserva Extrativista Verde para Sempre, em Porto de Moz-PA: mais de 80 fazendeiros dentro da reserva e conflitos com madeireiros.
- Lideranças ameaçadas de morte, só em uma região 19 pessoas ameaçadas, sendo 7 mulheres.
- Reservas extrativistas marinhas: avanço de grandes empresas do setor hoteleiro e turístico.
- Cadastro Ambiental Rural (CAR) feito por particulares/fazendeiros em cima das áreas de reservas extrativistas.