Foto: Alex Pazuello/Prefeitura de Manaus
A pandemia de coronavirus reforça e amplifica a discriminação e violência que historicamente os povos indígenas sofrem no Brasil e o Estado brasileiro têm que ser responsabilizado por isso. Em live realizada pela Oxfam Brasil em seu canal no Youtube nesta quinta-feira (18/6), a líder indígena Sonia Guajajara e o fotógrafo Sebastião Salgado culparam o Estado brasileiro pela omissão na proteção dos povos indígenas diante da covid-19, que pode levar a um genocídio de grandes proporções.
Veja a íntegra da conversa:
“A definição de genocídio é o extermínio de uma etnia e sua cultura. E é isso que estamos vendo em relação aos povos indígenas”, afirmou o fotógrafo Sebastião Salgado que, juntamente com sua companheira, criou uma campanha com apoio de diversas celebridades brasileiras e internacionais em defesa dos povos indígenas frente à pandemia.
“É de conhecimento do Executivo brasileiro essa fragilidade dos indígenas brasileiros em relação a doenças que vêm de fora de suas comunidades, como o coronavírus. Temos um governo que incentiva a violação das comunidades indígenas e essa situação fica ainda mais grave neste momento de pandemia. Então, essas autoridades do Executivo brasileiro são responsáveis. Sendo assim, se houver um genocídio, elas têm que ser julgadas, elas têm que ser responsáveis pelo que está acontecendo.”
Estado brasileiro é omisso em relação aos indígenas
Para Sonia Guajajara, a pandemia de coronavírus reforça todas as outras situações de desigualdade e violência que os indígenas sofrem historicamente no país. Com isso, apesar de todas as ameaças que vêm de madeireiros, garimpeiros e fazendeiros, o governo nada faz para protegê-los. “As práticas violentas de colonização dos indígenas ainda estão muito presentes. A pandemia ameaça de forma ainda mais violenta os povos indígenas, porque não temos nesse momento apenas o vírus nos matando. Temos o próprio Estado brasileiro que, com sua omissão, autoriza ou legaliza um novo genocídio.”
Sonia Guajajara afirmou que uma forma de proteger os povos indígenas seria demarcar territórios, porque a maioria ainda não tem seu lugar. Ela lembrou que dos 13% do país que são hoje territórios indígenas, cerca de 98% fica na Amazônia brasileira. No restante do país, os indígenas ainda lutam por suas terras.
No entanto, diz Guajajara, a violência existe mesmo nos territórios demarcados. “Todos sofrem com invasões de madeireiros, garimpeiros e grileiros, que destroem a terra e degradam o meio ambiente.”
Um terço dos povos índigenas brasileiras já foram atingidos pela pandemia
A pandemia de coronavirus já matou 294 e contaminou 5.613 indígenas em todo o país, atingindo 103 dos 305 povos existentes no Brasil, segundo dados da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), da qual Sonia Guajajara é coordenadora. A maior parte dos mortos (139) foi na região amazônica.
Além disso, a pandemia tem provocado mortes de diversas lideranças indígenas, como Paulinho Paiakan, morto na quarta-feira (17/6) depois de passar 10 dias internado com covid-19.
“O próprio Estado brasileiro está contribuindo para levar o coronavírus para dentro dos territórios indígenas. São militares, médicos e servidores da Funai que não estão tomando os devidos cuidados ao entrarem nos territórios”, afirma Sonia. “Com isso, é fundamental perguntar: como fazer para evitar mais mortes, diante de um Estado que é omisso e está com o genocídio institucionalizado?”
Para Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil que mediou a conversa entre Sonia Guajajara e Sebastião Salgado, da mesma forma que o coronavírus extrapolou as fronteiras dos países, é importante que os direitos humanos, a proteção da biodiversidade e o respeito aos povos indígenas também rompam as fronteiras.
“O retrato que temos é muito duro hoje no Brasil. É preciso que as pessoas entendam o que está acontecendo. É inadmissível que tenhamos tanto descaso com a situação dos indígenas.”